terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Jardim corta no emprego para estrangeiros


SOS Racismo repudia medida do Governo Regional da Madeira, acusando Alberto João Jardim de promover atitudes "xenófobas" e "racistas" contra cidadãos de países não comunitários.
A versão portuguesa da frase "British Jobs for British Works!" já chegou a Portugal, com sotaque madeirense, já que o Governo Regional limitou para 20 o número de trabalhadores extra-comunitários que as empresas do arquipélago podem contratar durante este ano, através do centro de emprego local.
"Nós já não estamos no pico de obras do ano 2000, em que foi preciso importar bastante mão-de-obra, agora trata-se de dar resposta à mão-de-obra madeirense", disse o presidente do Governo Regional, durante um jantar de empresários ligados à construção civil. Um apelo que se estendeu a todos os sectores, e que mereceu fortes críticas não só da oposição regional, mas também da organização SOS Racismo, que classificou a atitude de Jardim de "xenófoba", "racista" e "anti-constitucional.
"Não é surpresa que o Dr. Alberto João Jardim tenha atitudes xenófobas e racistas em relação a comunidades estrangeiras", acusa a direcção da SOS Racismo, lembrando o 'caso dos chineses', em Julho de 2005. No entanto, lamenta que Jardim siga uma "corrente política enraizada" - lei da imigração - que foi "um fracasso" ao nível do programa nacional e ao nível dos programas regionais, disse Mamadu.
"Repudiamos a atitude do Dr. Alberto João Jardim que sempre foi xenófobo e populista, e condenamos a forma impune com que atropela todas as normas constitucionais, discriminando os trabalhadores em função da origem", concluiu.

in Expresso (online)

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Um “pequeno” problema dentro da grande problemática da luta pela terra


Fotos e Texto - Ricardo Gomes

Comunidad Los Hornos – Chimaltenango

Desde a guerra contra os indígenas e camponeses que assolou o país dos anos 70 aos 90, o problema da distribuição da terra sempre foi algo que ficou por resolver completamente. Se foi um dos motores que levantou os indígenas do país, uma das principais bandeiras que uniu os que até aí tinham sido esquecidos, marginalizados e explorados, hoje, este problema está bem longe de encontrar uma solução.
No presente e após os Acordos de Paz, após o governo Guatemalteco ter assinado a convenção 169 da OIT que garante o direito à terra como um direito dos povos indígenas, os números demonstram uma realidade bem diferente daquela que as convenções escrevem. Cerca de 62% da terra cultivável está nas maos de 2% de proprietários, realidade esta aliada a uma lei que os favorece no que toca ao pagamento de impostos. Assim que, na prática, quanto menos terra se tem, mais impostos se paga, neste caso os indígenas, 65% da população, mas também camponeses pobres. A isto, temos de juntar o facto de que há cerca de 500 mil pessoas sem terra.
Todos estes problemas são consequência de um sistema latifundiário ainda vigente na Guatemala, com muitas características nascidas da invasão espanhola de há 500 anos. Assim que, hoje em dia, por estes lugares ainda faz sentido falar do Direito Histórico pela Terra, motor de muitas das reivindicações do movimento indígena.
A pequena comunidade de Los Hornos tem uma história que encontra semelhanças em muitas outras. Habitada por indígenas Kaq’chikel desde os remotos tempos da grande civilização maia, continua ainda hoje habitada por eles mesmos. Kaq’chikel é o idioma que aí se fala, Kaq’chikel é o traje, Kaq’chikel é ainda hoje a mentalidade, uma afirmação cultural contemporânea e mantida como forma de vida. Já não são os mesmos Kaq’chikel de antes, mudaram com o passar dos tempos, incluindo o facto de que hoje em dia a terra ter passado a ter propriedade e um papel afirma que agora estas terras onde estou têm um só dono que dispõe dela ao seu bel prazer.
Talvez nos seja difícil de entender, mas ainda hoje me é transmitido na comunidade, que a terra nao pode ter donos, que a terra era dos seus “avós”, que assim foi durante o passar dos tempos até que a invasão espanhola acabou com esse costume. A duas horas de caminhada, subindo e descendo montes vamos encontrar um campo de milho. Ao pôr-nos a escavar um pouco, são ainda visíveis pontas de setas de obsidianas, lugar de batalha entre kaq’chikeles e espanhóis. Algumas pedras com gravuras mostram-nos também provas de ter havido aí populações residentes.
Ora estas são algumas das evidências enviadas ao tribunal de direitos humanos da Organização dos Estados Americanos, OEA, à qual foi já formulado um pedido formal reivindicando essas terras por Direito Histórico, do qual a resposta que obtiveram foi um pedido de mais papel e burocracias a que não estão nada habituados. Aliás, é preciso notar que estamos a falar de uma comunidade agrícola, onde o analfabetismo atinge a maioria da população, o que faz esta tarefa mais difícil. Algumas organizações ajudam, mas estas são muito poucas para tantos problemas.
Enquanto isso, às dificuldades burocráticas juntam-se as que têm que ver com a sobrevivência. O dono das terras cortou-lhes o acesso à água e como consequência é tarefa diária atribuída às crianças, carregar bidons. Para agravar mais a situação, as crianças não podem ir buscar este precioso bem aos lugares mais acessíveis por estarem guardas armados, que intimidam a população, roubam gado ou obrigam por vezes a pagamentos em dinheiro para os deixarem em paz. Enquanto isso, as crianças têm de caminhar carregadas durante uma hora.
As queixas foram feitas às entidades locais, ao governo e tribunais, mas é preciso não esquecer que a Guatemala é um país onde a impunidade reina num lugar onde a justiça não funciona.
Falamos de uma pequena comunidade, 90 famílias. Mas falamos de um pedido que a ser aceite poderia ser o primeiro caso na Guatemala e abrir um precedente muito importante nesta complicada questão da terra. Difícil será, porque se esse direito é algo inerente às populações indígenas, como forma de os ressarcir historicamente, a questão da propriedade costuma pesar mais nestas decisões.